De nossa adolescência esbraseante, teu coração tornou-me um tanto dissemelhante.
Uma verídica tocha fogosa surgiu em mim e decaiu em nossos sentimentos, tornando-me servo de Afrodite, escravo do teu ardor amoroso dilacerante.
Nossos corpos delineavam um violão nas noites de verão, intensificando o calor de nossa excessiva paixão. Imaginávamos uma recente canção para nossa dança erótica naquele escondido compartimento de minha casa. Uma delícia de perdição carnal.
Éramos os vermes mais jubilosos que existiam por ali. Via teus olhos azuis luzirem para os meus. Sentia tua pele macia acometer-me uma insana sinestesia, já que não com as mãos a sentia, mas sim com os lábios carnosos e famintos por tua açucarada pele.
Vagarosamente, envelhecíamos. Nosso enlace não continuava com a mesma quentura de tempos anteriores, entretanto ainda nos saboreávamos com a mesma canção daquela dança que fizemos quando nossos sangues eram mais flamejantes e, talvez, bem mais delirantes.
Percebia, diariamente, o azul de teus olhos sendo trocado pelo cinza tristonho de tua futura cegueira. Tua pele enrijecia-se com uma velocidade terrificante. O teu sorriso não mostrava mais aqueles dentes cintilantes dos tempos em que éramos facilmente embriagados pelo amor. Parecia que Afrodite não nos queria mais como escravos dela. Não tínhamos o desejo antigo afrodisíaco de nos entrelaçar. Os pescoços dos cisnes apaixonados haviam sido apartados pela tua inclemente moléstia. Agora, estava gélida, onde, mesmo assim, continuava a me aquecer a alma. Tua magreza horripilante e os olhos esbranquiçados não arruinaram minha paixão por ti, mas a morte, esta impiedosa com o ser humano, sim.
De todas as mulheres que provei até o fim, nenhuma venceu o amor que tenho por ti. Talvez, seja esse o motivo de não me verem partir daqui, pois em cada moça que concretizo este tal Amor, Afrodite ainda se lembra de mim em seus pensamentos, fazendo com que, na verdade, eu delicie minha amada juvenil. E agora? Como irei partir? Se ainda provo do fervor metafísico de teu corpo.